RASGANDO AVENIDAS - UMA MUDANÇA DEFINITIVA NA CARA DA CIDADE

23/10/2013 11:07

        Quem andar hoje pelas avenidas amplas de Pelotas talvez não se lembre de como elas eram antes de começarmos o trabalho de interligação de toda a cidade, visando acabar com o sistema radial,  única  opção para chegar aos bairros.

         A Avenida Bento Gonçalves só ia até o Colégio Pelotense. Depois vinha o forno do lixo e um banhado enorme, junto ao Arroio Santa Bárbara.

        Construímos as pontes sobre o arroio e depois fizemos passar por ele uma avenida em concreto, com duas amplas pistas e canteiro central. Ela avançou até chegar, por um lado, à Avenida Duque de Caxias; pelo outro, seguiu paralelamente ao canal, compôs com a outra e mais a João Goulart um grande trevo - e avançou Fragata a dentro, transformando-se nas Avenidas Theodoro Muller e Francisco Nunes de Souza, que se estendem por vários quilômetros,  todas em concreto.

        A respeito desse complexo aconteceu comigo algo que considero até hoje como profundamente ilustrativo. Uma tarde, entrou no gabinete uma senhora furiosa e foi me perguntando o que eu tinha contra a sua família. Surpreso, disse-lhe que nada; e que até me dava bem com alguns parentes seus - ao que ela quis saber por que, então, tinha quatorze ações de desapropriação de terras de seus familiares... Disse-lhe que tinha, sim, e que esperava até um agradecimento, pois em cada uma das áreas estava surgindo uma nova avenida que iria valorizar as terras, sem que cobrássemos contribuição de melhoria, dispondo-nos, ainda, a indenizar as terras pelo valor de mercado: só teriam a ganhar, portanto.

        Mas, a conversa não terminou por aí. Aproveitei para explicar que estava faltando dinheiro para desapropriar a antiga área do forno do lixo, onde passaria uma moderna avenida, de duas mãos, valorizando enormemente a área, a Avenida Bento Gonçalves. Disse-me que essa área era de um parente seu, que morava no Rio de Janeiro e que estava por chegar; pedi-lhe que o convidasse para um contato. Pouco tempo depois recebi a visita, comunicando ao proprietário nossos propósitos, solicitando-lhe a doação da área, pelos evidentes  benefícios que lhe adviriam da obra. Ponderou-me ele, entretanto, que não só não doaria nada, como lutaria na justiça para impedir a desapropriação, se houvesse, pois gostava de ali passear a cavalo quando vinha a Pelotas, lembrando as vezes que andara assim no colo de seu avô. Perguntei-lhe se na avenida onde morava, no Rio de Janeiro, também andava a cavalo, ao que me respondeu que no Rio cavalgava na hípica. Ofereci a oportunidade de também cavalgar na hípica de Pelotas, pois queríamos ter  naquele local uma avenida que poderia vir a ser semelhante àquela em que ele morava. Não adiantou.

         Lamentei e lhe disse que iria conseguir o dinheiro e fazer a desapropriação não só da área para a Avenida, mas também das laterais, pois não iria permitir que pessoas que ostentavam total ausência de espírito público viessem a se beneficiar de obras feitas pela municipalidade. Foi o que aconteceu. Desapropriamos a área e mais as laterais, instalando num dos lados o Parque do Trabalhador e, no outro, repartições municipais.

 Um pouco adiante fizemos a ponte de transposição do Santa Bárbara, que no futuro permitiria a ligação das Três Vendas com o Fragata. A ponte ficou esperando a pavimentação da  Avenida do lado das Três Vendas, que acabou sendo feita em nosso segundo Governo; e, por ligar dois bairros, permitindo uma economia de onze quilômetros, apelidamos de Avenida Inter-Bairros, mas depois recebeu a denominação oficial de Francisco Caruccio.

         Pelo outro lado do Fragata fizemos a Frederico Bastos, a Baronesa de Gravataí e, além de mais uma ponte sobre o Arroio Santa Bárbara, a Tenente Lira e a Imperador D. Pedro I, todas em blocos “unistein” e que conduzem à BR 293, ligando o Bairro Fragata ao Porto.

         Já no Bairro Areal, pavimentamos a Avenida Ferreira Vianna em concreto cimento,  facilitando a ligação com o Laranjal, e fizemos toda em bloco unistein a São Francisco de Paula, que considero a avenida mais bonita de Pelotas, ligando o Areal às Três Vendas, com iluminação a vapor de sódio, como as demais,  e com um novo sistema de drenagem por canais, que vão desaguar no São Gonçalo.

 Fizemos ainda a avenida Juscelino Kubitschek, em concreto. que  liga as Três Vendas com o Areal e depois com o Porto.

         As avenidas do Areal foram prioridade no Projeto Cura Baronesa, para o qual obtivemos recursos junto ao Banco Nacional de Habitação e foi realizada uma verdadeira revolução urbana naquele Bairro. Quem não lembra o que eram o Corredor das Tropas e a Ferreira Vianna, onde, tirando a parte fronteira ao Bairro Cruzeiro do Sul, só era possível o trânsito a cavalo ou a pé. Além das avenidas foram pavimentadas várias ruas, que receberam toda a infra-estrutura.

         Depois do anel viário que liga a Av. República do Líbano com a Juscelino e a São Francisco, segue a Av. Ildefonso Simões Lopes, ligando-se com o Arco Iris e com a Avenida Leopoldo Brod, que por sua vez se liga com a Zeferino Costa, que leva ao Aeroporto e ao Quartel General. Esse conjunto constitui o chamado Contorno de Pelotas, cuja pavimentação obtivemos junto ao Governo do Estado em nosso segundo Governo, e à qual juntamos a Avenida Guadalajara.

         Para capilarizarmos o sistema de transporte pavimentamos  parte de inúmeras ruas auxiliares, que passaram a constituir uma rede excelente  para uso dos coletivos, atendendo aos seus trajetos àquela época. Dessa rede, salientamos as ruasl: João Gomes Nogueira, Bandeirantes , Guadalajara,  prolongamento da Juscelino Kubitscheck, Luiz Alves Pereira, Magda Costa, Sotero dos Reis, Luciano Galet, Moacir Dias e Mário Meneghetti, no Areal; 25 de julho, João Jacob Baini, São Luiz, São Paulo, Sítio Floresta, Santo Antônio, Inter Bairros e Vila Peres, nas Três Vendas;  e João Carlos Cortelari, no Fragata, além de Carlos Gotuzzo Giacoboni e Paulo Zanota da Cruz, no segundo mandato.

         Esse conjunto de vias modernizou a cidade e permitiu várias alternativas de acesso a todos os bairros, além de possibilitar a criação da linha de ônibus Inter-Bairros, que lançamos no segundo Governo e que veio facilitar enormemente a vida dos trabalhadores que moram em um bairro e trabalham em outro e que anteriormente tinham que tomar dois ou mais ônibus.

         É importante lembrar que fizemos a opção pelo concreto-cimento e pelo bloco de cimento tipo unistein pela sua durabilidade. Um pouco mais cara do que o asfalto, a opção permitiu uma durabilidade muito maior, sendo importante vermos, por exemplo, a avenida Ferreira Vianna, com tráfego pesado e com pouca manutenção e que já tem mais de vinte anos de idade. Pode-se imaginar a manutenção constante que teria de receber se houvesse sido pavimentada com asfalto...

         A última obra que fizemos, no final do segundo mandato foi a duplicação da ponte sobre o Arroio Pelotas, na estrada que vai ao Laranjal e a duplicação da própria estrada, que permitiram um fluxo livre para as praias da Lagoa, acabando com os engarrafamentos, principalmente no verão.

         Junto com ela, no Laranjal, as Avenidas José Maria da Fontoura e Antônio Augusto de Assunção,  no Balneário Santo Antônio,  a última com três quartas partes pavimentadas e que não pudemos concluir por causa de um mandado de segurança, obtido por uma moradora que não concordava em pagar a contribuição mínima que havíamos acordado com os proprietários  de casas situadas na Avenida. Até hoje aquela quarta parte da avenida tem barro no inverno e poeira no verão...

          A Avenida Amazonas, no Balneário dos Prazeres, teve uma das pistas pavimentada  em unistein. no primeiro governo e  ficou esperando nossa volta, para ser completada doze anos depois, no segundo governo.

          Para o projeto Baronesa, no Areal e o projeto Fragata, no bairro do mesmo nome, através dos  quais foram construídas as grandes avenidas, afora a contrapartida de 15%, com recursos próprios, que a Prefeitura tinha que dar, os recursos vieram do BNH.

A propósito de tais recursos, é justo que se faça aqui um registro, sobre a atitude de um homem que honrou o nosso Estado: Sinval Guazzelli. Ele era Governador do Rio Grande do Sul, nomeado pela Arena. Eu era Prefeito de Pelotas, eleito pelo MDB. Por essa circunstância, enquanto nossos técnicos se esmeravam junto com os do BNH para desenvolver um planejamento de investimentos que viriam a marcar época nesta cidade, as pressões políticas se desenvolviam absurdamente, prejudicando a cidade, na tentativa de inviabilizar ou ao menos retardar a realização das obras.

         Em determinado momento, estava tudo pronto para ser aprovado pelo BNH, mas a Diretoria do órgão não colocava o convênio de Pelotas na ordem do dia. Houve pressão dos técnicos federais e até uma ameaça de que não elaborariam novos pareceres enquanto não fosse aprovado o nosso convênio. A pressão contrária era muito forte e nas reuniões das segundas-feiras não aparecia Pelotas.

         Procurei o Governador Sinval Guazzelli e expliquei o que estava ocorrendo. Na mesma hora ele tomou o telefone, discou para o Rio de Janeiro e, na minha presença disse ao Diretor do BNH que quem falava em nome do Rio Grande do Sul era ele e estava desautorizando quem quer que fosse que estivesse usando, indevidamente, o nome do Governo do Estado. Disse mais, que o Rio Grande tinha interesse direto na liberação imediata dos recursos  para Pelotas.

         Na reunião seguinte, a Diretoria do BNH aprovou, por unanimidade o nosso convênio. Oportunamente oferecemos a ele um grande almoço de homenagem, a que não faltaram os líderes locais da Arena. Na hora dos cumprimentos vi quando um dos mais retrógrados deles aproximou-se do Governador e lhe disse: “O senhor é bom como Governador mas  é péssimo como político”.

         Iniciamos assim um conjunto de obras que marcaria um novo tempo em Pelotas.

É indispensável um esclarecimento a respeito do fato de as Avenidas Ferreira Vianna e Juscelino Kubitschek de Oliveira não terem sido pavimentadas na sua totalidade.

À época, o Ministro da Fazenda  era Delfim Neto, que conseguiu a emissão de um Decreto por parte do Presidente da República, declarando que  a taxa inflacionária estaria prefixada em 20% ao ano, obrigando a que todas as liberações de recursos contratados pelo BNH sofressem reajuste máximo igual a essa percentagem.

         Como a liberação de recursos para as duas avenidas era feita em etapas mensais, aquele foi o reajuste anual dos desembolsos destinados às obras. No entanto, a realidade nacional era completamente diferente; e o custo da construção sofreu um acréscimo de 180%. Assim, cada parcela vinha com um reajuste inferior a 2%, enquanto o preço da construção aumentava mais de 8% a cada mês. Tivemos que consultar o BNH, que financiava as obras, sobre qual o procedimento a adotar e a resposta foi no sentido de reduzirmos o que eles chamavam de “meta física” ou seja, era impossível reajustar os recursos de acordo com o aumento do custo da construção, forçando-nos a reduzir o volume das obras que estavam projetadas e já em processo de realização.

        Felizmente foi possível atender às necessidades mais urgentes, ou seja: deixar a Ferreira Vianna com duas vias até o Bairro Cruzeiro do Sul, mas com uma pista completa, em toda a sua extensão; e abrir ao tráfego toda a Juscelino Kubitscheck, embora seccionada em algunas trechos. Nossa expectativa era de que os próximos prefeitos as completassem, o que não aconteceu até agora.

        Além da utilização dos recursos do BNH através dos projetos CURA, obtivemos o apoio técnico e depois financeiro da Empresa Brasileira de Transportes Urbanos – EBTU, do Ministério dos Transportes e do Geipot. Juntamente com eles fizemos o até hoje único Programa de Planejamento dos Transportes e Tráfego de Pelotas,  através do qual foram feitas várias indicações de caráter técnico para melhorar os fluxos urbanos, abrindo-se a porta para a obtenção de recursos a fundo perdido para a concretização de várias obras.

        Com esses recursos a fundo perdido, ou seja, dinheiro dado,  foram feitas a ponte sobre o Arroio Santa Bárbara da Avenida Inter-Bairros, a Avenida Cidade de Lisboa e o Corredor Exclusivo para ônibus da Avenida Duque de Caxias. Quanto a este é importante salientar que quando terminamos nosso mandato, ele se encontrava virtualmente pronto, faltando apenas algumas saídas e acessos.

         Da mesma maneira como aconteceu com a ponte sobre o Santa Bárbara, antes mencionada, sobre a qual o Prefeito que me sucedeu dizia que estava condenada e por isso não fazia a Avenida Inter Bairros, tive que voltar à Prefeitura para fazer as partes do Corredor de Ônibus do Fragata que faltavam. Doze anos depois, e quando tudo estava pronto, tive que enfrentar um movimento popular que não queria ônibus trafegando alí, para continuarem a fazer as caminhadas a que tinham se acostumado na década. “Vox populi, vox dei”: curvei-me à vontade popular.

Voltar

Pesquisar no site

© 2013 Todos os direitos reservados.